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Desaparecida a cinco anos, constatou a policia local. Disse pra mim o xerife de plantão: “Na época foi tudo devidamente denunciado, protestado e investigado e nada. Ninguém sabe onde essa menina se meteu, o povo da cidade tratou mesmo foi de convencer a família que era fuga, infelicidade. Já sabe né, cidade pequena, mundo grande; cabeça cheinha de sonhos, as historias, os contos que se contam na escola. Sugeri que demitissem a professora de literatura, essa moça que veio da cidade grande, moça descasada, chega aqui e causa barulho nas pequenas cabeças das crianças. Mas nunca ninguém me deu ouvidos, acho que ela causou barulho na cabeça de todo mundo. Mas eu fui forte, sabe moça. E sobre essa menininha – não era disso que a gente tava falando? – pois então, sumiu e não deu mais sinal. Te dou uma foto que eu tenho aqui, olha, se você souber de alguma coisa você volta ta!?”
O senhor xerife até que foi simpático, me mostrou as ruazinhas apertadas da cidade onde ela costumava brincar, a escola aonde ela ia todos os dias com a sua bicicleta rosa e me apresentou a professora. Ela não quis deixar seu depoimento, só falou que naquele dia, a poesia escolhida foi uma de amor, esses poemas normais de primeiro ano. Uns vizinhos falavam que ela fugiu pra encontrar alguém, outros falavam que ela fugiu pra procurar alguém. Mas ninguém na verdade sabia, nem mesmo a família, que chorava um pranto já seco, sabia.
Eu vim aqui de enxerida, metida. Vim escondida, nessa manhã de segunda, tentar descobrir o paradeiro daquela pequena menina que um dia bateu minha porta e me disse “bom dia, eu vim pra ficar”. Não era nenhuma desconhecida pedindo comida, naquele dia era a sorte batendo a minha porta, o vento soprando trazendo o meu amor. Ainda era menina quando chegou, na minha vida já era história antiga, de acampamento de verão. Hoje é mulher que se deita ao meu lado e me pergunta se fez bem em deixar tudo pra trás.
Eu vim aqui mesmo pra saber se um dia ela vai poder voltar, se um dia eu vou poder voltar pra visitar, se um dia a gente vai poder entrar por essas ruas juntas. Não encontrei nenhuma resposta, nada além do que eu já sabia, mas pelo menos vi os rostos, as ruas.
Voltei pra casa, sentei na beira da praia, liguei pra ela ir me encontrar ali. Quando ela chegou falei do xerife, da professora, da mãe. Perguntei: “Você não sente saudade?” e ela respondeu com um sorriso no rosto de quem sabia muito bem o que ia falar: “Claro que sinto meu amor, sinto todos os dias, mas um dia a gente troca os colos em que deitar, não esqueci aquele lugar, mas agora eu tenho você pra cuidar e quando o mundo estiver preparado eu volto, mas com você comigo, ao meu lado.”
Foi a primeira vez que a gente conversou sobre isso, também a última.
O que eu tive vontade de dizer em minha instância por lá foi que quando ela desapareceu pra eles, ela apareceu pra mim. Fui para, de alguma forma, me desculpar por ser feliz assim.

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1 Response for the "Desaparecida (por Raianne Senna)"

  1. Raquel says:

    Lindo. Confortavel de ler... parabéns!